Sexta-feira, 18 de Fevereiro de 2011

Dona Gertrudes Thomaz, e a sua visita à Nossa Senhora da Graça

 

 

            Fotografia actual (do Google)

 

O Presidente Almirante Américo Thomaz encontrava-se, mais uma vez, de visita ao Norte e, como de costume, alojado no Paço dos Duques de Bragança, em Guimarães. Nessa manhã, um domingo, havia saído cedo do Paço pois tinha várias sessões solenes agendadas, algures, pelo Norte e, sobretudo, no distrito de Vila Real.

Era domingo e estávamos no início de Julho ou em finais de Julho, não me recordo bem, e meus pais, de viagem para Carvalhelhos, onde meu pai, como médico e director clínico da estância, iria passar toda a época termal, haviam-me prometido passar por Guimarães para almoçarem connosco e rever os netos. Não contava, portanto, com a ordem que nessa manhã me foi dada pelo comandante do Batalhão para que acompanhasse a mulher do Presidente que, sem que este o soubesse, se queria encontrar com ele no alto da Nossa Senhora da Graça para onde estava aprazado, às 13h00, o almoço do Chefe do Estado e das demais individualidades que o acompanhavam.

O Santuário da Senhora da Graça ficava fora da área da minha jurisdição e já na de Vila Real, Ribeira de Pena, a ela contígua, sendo acedido através de um imenso emaranhado de estradas florestais, de terra batida, densamente arborizadas e sem qualquer espécie de sinalização que orientasse o viajante. Nem eu nem o meu motorista, vindo expressamente de Braga com o carro do comandante da Companhia, conhecíamos o itinerário e não houve tempo para recolher qualquer informação através das cartas militares pelo que foi à aventura que ambos partimos.

Dona Gertrudes Thomaz, que não conhecia pessoalmente, não obstante conhecesse a filha, amiga de meus primos, e a quem me apresentei pontualmente à hora que me haviam marcado, revelou-se-me uma senhora extraordinariamente simpática, simples e cordial e que, a despeito da doença de que era portadora e que lhe dificultava enormemente o andar, sorridente e bem disposta, logo se apoiou no meu braço e me pediu:

- Senhor Tenente, gostava tanto que me mostrasse os sítios mais bonitos por onde fossemos passando já que nada conheço para estes lados! Será que o pode fazer?

- Com toda a certeza, minha senhora. Pararei o meu carro e Vossa Excelência apenas terá de ordenar ao seu motorista que pare atrás de mim e terá, também, de confiar um pouco no meu bom gosto – completei sorridente e satisfeito com a sua afabilidade.

- Com certeza, com certeza… – respondeu ela de pronto. – Estou certa de que me surpreenderá e confio plenamente nas suas opções. O que gostaria – acrescentou – era de estar lá no Santuário perto da hora do almoço pois o meu marido não sabe que vou… é uma surpresa!

E foi assim que o pequeno cortejo dos dois carros, o da Presidência e o meu, seguindo à frente, rumámos ao alto da Nossa Senhora da Graça onde eu mesmo e como disse, iria pela primeira vez.

Correu tudo bem até passarmos Fafe, Celorico de Basto e o Arco de Baúlhe, começando as coisas a ficarem complicadas quando entramos no emaranhado das estradas da floresta pois eram frequentes as bifurcações que, com o auxílio de uma pequena bússola que trouxera, nos obrigava a optar: - ou pela esquerda ou pela direita e correndo sempre o risco de irmos ter onde não queríamos.

Entretanto, nos locais mais bonitos da linda e rude paisagem serrana que, a cada curva se nos ia deparando, já várias tinham sido as paragens feitas e outras tantas as vezes em que fora ao carro da Presidência, ajudando a simpática senhora a apear-se após o que, pelo meu braço, a conduzia até aos pontos de onde melhor poderíamos espraiar a vista pela imponência dos enormes vales e serranias que, naquela época do ano, tão bem acolhiam, com o sussurrante ruído característico das suaves brisas que, constantemente os percorrendo, atravessavam os densos pinhais que os cobriam, deleitando, assim, os sentidos, a quem tivesse o privilégio de os puder, ali, observar e admirar.

- Que lindo, que bonito! – ia dizendo Dona Gertrudes Thomaz a cada paragem que fazíamos, nunca suspeitando da incerteza do itinerário que seguíamos e que, quis Deus, que, nos conduzisse directamente ao Santuário onde, exactamente às 13h00, parámos os carros no sopé da escadaria.

O Presidente, que já lá se encontrava, ao ver-nos chegar, não se coibiu de descer algumas das escadas e num dos raríssimos sorrisos que alguma vez vi no seu rosto, exclamou.

- Gertrudes!... Tu por aqui? Mas isto é mesmo um milagre da Nossa senhora da Graça! – mal sabendo ele quanto o era, de facto…

publicado por Júlio Moreno às 12:01
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